O que as empresas precisam fazer para sobreviver no novo mercado?
A não ser que você tenha vivido em Plutão nos últimos 10 anos, não é novidade para ninguém que o mercado mudou muito. Na última década vimos ruir verdadeiras fortalezas inexpugnáveis que todos imaginavam ter o seu futuro garantido. Bastava para isso continuar fazendo o que sempre fizeram que tudo se manteria igual. Exemplos não faltam:
Blackberry:a companhia chegou a ter mais de 50% do mercado de celulares nos Estados Unidos, em 2007.
Blockbuster: Nem milhares de clientes fiéis foram capazes de manter seu funcionamento quando surgiu a internet com disponibilização de títulos online, e serviços de streaming em demanda, como Netflix. Inclusive, pasmem, a Blockbuster teve a oportunidade de comprar a Netflix, e não quis, quando ela era uma empresa de delivery de DVD’s. A empresa faliu em 2013.
Yahoo: O Yahoo! era o maior portal de internet do mundo em 2005 e chegou a valer US$ 125 bilhões. Em 2008, já em decadência, negou a proposta de compra pela Microsoft por US$ 44,6 bilhões e acabou sendo vendida este ano por apenas US$ 4,8 bilhões à Verizon.
Editora Abril: Aqui no Brasil, insistindo em vender papel ao invés de conteúdo, o grupo Abril deu entrada na Vara de Falências e Recuperações Judiciais de São Paulo, em 15/08/2018. O valor total da dívida é de R$ 1,6 bilhão sendo que a maior parte está nas mãos dos bancos.
Os exemplos não param por aí. Evidentemente que em cada caso existem questões específicas que levaram as empresas a esta situação e o meu objetivo não é explicar cada um deles. Meu foco é outro. Como as empresas podem se prevenir para não trilharem o mesmo caminho do fracasso? Novamente, cada caso precisa ser aprofundado, mas me atenho a uma questão que vem me incomodando quando esta discussão surge no mundo corporativo.
Muitos executivos ainda vivem em um mundo em que acreditam que o diferencial da sua empresa está apenas no produto. Desta forma toda a estrutura reflete esta visão ultrapassada, e que foi importante até o final do século passado.
Nos dias atuais, ter um bom produto é apenas o ingresso para o jogo. Quase todas as ofertas das empresas se comoditizaram. O diferencial é quase inexistente e uma empresa hoje pode até abrir mão de seu parque fabril, terceirizando esta atividade e gerenciando apenas a sua marca. Alias, várias delas já fizeram isso.
Atualmente a concorrência vai além do produto, serviço, atendimento, preço, condições comerciais, disponibilidade e satisfação pessoal. Proponho trocarmos todas estas características acima por uma apenas, chamada de experiência de compra e pós-venda, ou seja, a jornada completa do cliente, que envolve os aspectos racionais e emocionais em todos os pontos de contato do cliente com a sua marca.
Quando a empresa passa a se comparar não pelo produto, mas pela experiência do cliente, a situação que já não era fácil, torna-se muito mais complexa. Vamos imaginar a seguinte situação: uma empresa acaba de lançar um novo aplicativo de serviços para o produto que vende. De acordo com o gerente de produto (sim, ainda existem empresas que mantém este cargo) o App desenvolvido é o melhor de sua categoria, quando comparado aos seus concorrentes.
Talvez para chegar a este resultado, a empresa teve muito trabalho. Porém, a visão dos clientes não é esta. Segundo os mesmos, o App é difícil, contra intuitivo, pesado e feio. Mas é o melhor em relação à concorrência direta, diz a empresa. Acontece que os clientes não o comparam mais em relação aos seus concorrentes, mas com todos os Apps disponíveis de todas as empresas, não importa o segmento em que sua empresa atue. Desta forma, o App da sua empresa passou a ser comparado agora com o do Uber, 99 táxi, AirbnB, iFood, Rappi etc.
A experiência do cliente traz todas as empresas para o mesmo patamar de expectativa e ele não é mais condescendente com falhas, bugs, interação complexa ou design feio. Se a empresa de entregas rápidas por motoboy consegue dizer onde está o mensageiro no mapa, por que a sua empresa não é capaz de dizer onde está o produto que ele comprou? Ele não quer saber se o pedido está no prazo de entrega. Quer saber qual o dia e horário a mercadoria chegará. Se a sua empresa não consegue dizer isso ao cliente, lamento. É o mínimo que ele espera de você.
São inúmeras as situações que você, executivo ou empresário deve evitar a todo custo na relação com seus clientes:
Dizer ao mesmo que ele deve usar outro canal de comunicação interna para que a empresa direcione sua reclamação. Ele não irá. É o cliente e não a empresa que escolhe o canal, de acordo com a sua conveniência;
Interagir com o cliente por meio de scripts de atendimento frios e mecanizados. Mesmo nos chamados BOTs de atendimento é possível ter uma conversa mais amigável. A interação com seus clientes é feita por um terceiro e o critério de contratação foi o velho TMA (Tempo médio de atendimento)? Vejo nuvens negras em seu horizonte.
Transbordo de ligação. O cliente quer ser atendido pela primeira pessoa que atende sua solicitação. Transferir o problema para outra área o irrita, principalmente quando ele tem que repetir suas informações;
O cliente não entende o motivo pelo qual ele deve digitar todas as suas informações no sistema, para o atendente humano pedir para falar tudo novamente;
Dizer que irá retornar o contato com o cliente e não fazer é um desrespeito enorme com ele. Jamais faça isso;
Se os sistemas da sua empresa não conversam entre si, isto é problema seu. O cliente não tem nada a ver com isso. Priorizar a visão cliente significa entre outros aspectos, que sua empresa deve trabalhar na revisão geral de sistemas e processos.
Justificar uma falha na experiência do cliente com processos ou falta de pessoal, significa que a sua empresa está no caminho do fracasso.
Se a estrutura organizacional da sua empresa é segregada, ou seja, cada área cuida de suas responsabilidades, objetivos e metas, é exatamente isso o que farão. Ninguém terá a visão completa da jornada do cliente e a experiência dele não será uniforme.
Poderia trazer inúmeros outros exemplos sobre o que não fazer com o cliente. Mas prefiro agora mencionar uma lista de sugestões para sua empresa melhorar a relação com os mesmos:
Transforme a estrutura da sua empresa, fazendo o De -> Para
DE PARA
Vertical Horizontal
Hierárquica Descentralizada
Comando & Controle Poder decisão na ponta
Silos internos Equipes multidisciplinares
Visão produto Visão cliente
Áreas segregadas Times de clientes
Importante:não adianta você colocar várias pessoas para se sentarem em um mesmo ambiente e chamar isso de Squad ou Metodologia Ágil. Não se engane. Para as equipes trabalharem desta forma, é preciso além de metodologia, uma mudança profunda no mindset de todos, a começar pelos executivos de cima.
Equipe protagonista: Os executivos precisam entender que o protagonismo agora deve ser das equipes e não deles. Empresa que acredita que poucos executivos pensam e os demais executam, está fadada ao fracasso. São as pessoas que estão em contato direto com os clientes é quem melhor tem condições de melhorar a vida dos mesmos. Os executivos devem se colocar à serviço das equipes, orientando, dando as diretrizes mais amplas e ajudando no desenvolvimento de seus colaboradores.
Atrito zero:Sua empresa tem de reduzir ao máximo todo e qualquer atrito na jornada do cliente. Isso inclui a revisão de todos os processos, abordagens e interações. O papel da sua empresa é se tornar invisível ao cliente. Ele simplesmente desfruta de seu produto e serviço, enquanto você faz o trabalho pesado nos bastidores e em silêncio. Em todas as interações com seus clientes, sempre há um trabalho a ser feito. Existem dois caminhos: a) Você terceiriza o trabalho e os custos para o cliente e a satisfação dele cai, ou b) Você internaliza o trabalho e seus custos e a satisfação do cliente aumenta. A decisão cabe à sua empresa. E aos seus concorrentes, óbvio.
Visão de fora para dentro: Quem manda na relação é o cliente e não sua empresa. É imperativo que as empresas parem de desenvolver produtos, soluções, interfaces etc., com a visão de tecnologia. Se a sua empresa trabalha desta forma, pare imediatamente, porque ela está em risco. Qualquer forma de interação com o cliente deve e precisa ser feita de acordo com a visão dele. A partir disso, a área de tecnologia deve desenvolver o que o cliente entende e não o que os técnicos sabem. Jargões técnicos ficam proibidos sob todas as formas. Se você considera que seus processos e sistemas devem estar acima de seus clientes, lamento em dizer que a sua empresa já está morta e você como executivo ou empresário já foi obsoletado pelo mercado. Espero que você já tenha construído um bom patrimônio, porque será expulso do mercado rapidamente.
Tenho consciência que a mudança para o novo mercado dentro das empresas é difícil, complexa, cara e que leva tempo. Mas o tamanho do desafio é este. Estamos todos em um momento de mudanças épicas na sociedade e apenas quem conseguir se adaptar rápido, continuará no mercado.
Ao invés de ficar na fase de negação, que tal começar já esta mudança? Quanto mais o tempo passa, mais caro fica.
Boa sorte. Você vai precisar.
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